Emílio Sant’Ana: ‘Eu sou da montanha’

Emílio Sant’Ana: ‘Eu sou da montanha’

9 de outubro de 2018 0 Por Paulo Prudente

“É uma manhã de sábado. Saímos para nosso treino com expectativa de dia calorento e uma dura subida pela frente. À medida que a inclinação castiga as pernas apenas brevemente aquecidas por alguns alongamentos, o verde do entorno encanta e a descoberta do que tem após cada curva do novo percurso me distraem. Ciclistas sobem e descem. Turistas tiram fotos nos mirantes da Estrada das Canoas enquanto vamos subindo, subindo… A temperatura não sobe além do que o calor do corpo normalmente produz no trabalho de ascender essas massas às alturas.

Finda a estrada. Aproximadamente dois quilômetros de trilhas até o topo numa caminhada digna de quem após correr obrigatoriamente todo o ano para estar apto a provas apenas quer curtir o sábado na montanha num final de semana de dezembro. Turistas e corredores sobem e descem ao som dos habituais cumprimentos de cortesia e ânimo! No cume da Pedra Bonita a sensação de alívio pela conquista (e porque também não fora tão difícil dado o preparo prévio) e a surpresa reservada: uma forte neblina cobrira todo o litoral e a base da montanha! Ela é da praia, do mar; se ficou quase decepcionada em não avistar o mar e a praia de São Conrado, logo arquivou! Eu sou da montanha, estar acima das nuvens é um desejo intrínseco do montanhista. Curti muito! Finalizando o causo, tiramos algumas fotos, hidratamos e o sentimento mútuo era de conquista e satisfação pessoal: estávamos onde queríamos estar!

Quando vou apresentar o trail running, seja em palestras para ávidos grupos ou em conversas pessoais quando me perguntam: “Eu vejo suas fotos, mas não entendo. O que é que você faz mesmo?”. Além do tradicional e teórico “corro em trilhas e montanhas” eu resumo em alguns valores o nosso esporte: conexão, preservação, solidariedade, superação, sonho, diversão e gratidão-comprometimento!

É crescente o interesse e o encantamento com as trilhas e a montanha no Brasil. Mas aparentemente o interesse está só no “fim/resultado” sensível: cume, conclusão, medalha, belas fotos, sensação. Estamos concentrados na expectativa de ver nosso esporte figurar em grandes estatísticas e talvez insensíveis à grande probabilidade de não cumprir expectativas e parecermos “mais um grupo de fanáticos por endorfina e adrenalina”. Se orientarmos essa “corrida à montanha” sem atenção e honestidade quanto o “meio/caminho” que leva aos mesmos cumes, conclusão, medalha, belas fotos, e que cria a sensação, seremos mais um esporte de temporada. Palco temporário de oportunidades e baú de recordações: quem nunca passou por isso?

Correr com a alma! Não sugere apenas nome da seção dessa revista, mas remete aos primórdios da modalidade quando podia ser chamada de “Feel Running”: correr com o sentimento ou com a sensibilidade. É uma realidade orgânica, é um chamado antropológico, é uma vocação humana. Tudo isso junto resgata e promove qualidades físicas, que geram empoderamento psicológico e sensação de capacidade ilimitada. Esses são os fundamentos da evolução humana. Força, certeza e imaginação. Tudo isso precisamos para constatar que é muito bom e gratificante praticar trail running? Não, tudo isso para mostrar que investir nossas vidas nesse esporte nos torna mais humanos!

Esse papo continua numa próxima oportunidade, ou se quiser no meu e-mail ou DM’s… a porta está aberta e o café quente na mesa, assunto e causos vamos criando até lá, UP!”

Emílio Sant’Ana é treinador na Omega Assessoria Esportiva, graduado em 1997 UFES (CREF 906-ES), Diretor Técnico de Provas Trailrun, colunista do Portal Go On Outdoor; pode ser encontrado em alguma montanha capixaba, ou na Floresta da Tijuca, não necessariamente nessa mesma ordem. Contato: [email protected] / FB Emílio Sant’Ana ou IG @emilio_omega